Área particular. Mantenha-se afastado!

Era uma vez um Dominador nada louco que fundiu a fantasia com a verdade e aqui vem contar algumas de suas disparidades.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Dom Demétrius e Jezebel – a insubmissa [Parte Pausa]


O que ainda há para ler?
1. O jogo na masmorra Dele. Final de sexta-feira;
2. O dia de Sábado;
3. Domingo e fechamento;
Mas... só no ano que vem!
*sorriso*

Boas Festas!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Dom Demétrius e Jezebel – a insubmissa [Parte 004]

Dom Demétrius e Jezebel – a insubmissa – [Parte 004]


Quando ela ficou completamente nua e resolveu relaxar, se é que isso era possível naquela situação, Ele – de fato – começa seu jogo.
- Por favor, Jezebel, (disse com voz firme, porém meiga, apontando uma das várias caixas que foram feitas na parede) abra a caixa de número um. Só então ela vira-se acompanhando o jato de água e nota que tem 25 caixas numeradas atrás de si. Abriu a um. Uma bela embalagem. Ela reconheceu o logo e a cor. Era de uma daquelas lojas que eles pararam no caminho. Mas como foram parar ali? Ela o viu sair sem nada, não lembra das embalagens quando voltou ao carro, mas estava perturbada demais para observar algo assim. Antes que pudesse pensar mais... – Abra Jezebel. Ele ordenou.

Era um sabão líquido em uma embalagem pequena e muito bonita.
Sua cor era um creme-rosado-brilhante. Seu cheiro o de madeira de carnaúba depois de uma chuva moderada seguida por sol forte. Sua textura de quero abraçar.
Ela o pegou nas mãos, se virou de frente para Ele. Sentado, mandou que ela lavasse os cabelos com ele.
Assim foi feito. De longe, ele coordenava a água que ia de morna a quente.
- Abra a caixa dois, por favor. É o condicionador.
Ela pensou que ainda tinham 25 caixas e que se fosse abrir uma por uma, a noite iria passar somente no banho, mas pela postura e calma Dele, estava claro que não havia motivos para pressa. Melhor ceder e não correr.
- Enrola os cabelos com esse condicionador e abre, por favor, a caixa oito, Jezebel.
Ao que parecia Ele sabia exatamente o que havia em cada caixa daquelas. Jezebel excitava-se diante da maestria do momento, porém ao mesmo tempo se perguntava se Aquele homem não errava nunca.
Ela fez o que foi ordenado e ao abrir a caixa oito deparou com um sabonete bem pequeno, a cor era de ouro, o sabor de frutas da estação, a textura de poder, o peso da cobiça. Estava claro que era algo caro, desejado por muitos, tido por poucos.
Ela o pegou e quando se virou Dom Demétrius estava, de pé, à frente dela.
Olhando-a dentro dos olhos pausadamente mandou que ela lavasse o corpo com aquele sabão.
Não afastou-se. Olhava a tudo de forma constrangedora, atenta. Ela passava o sabonete, sentia algo sem igual, um frescor, uma carícia de mãos de fada, uma vontade de mais.
Passou sem correr, Ele de frente. Ela tentou virar-se um pouco e com uma cane, que ela ainda não havia visto, Ele a volta à posição anterior. De frente para Ele. Exposta.
Por todo o tempo ela mesclava. Horas estava com a cabeça totalmente baixa, horas levantava, de um salto, e buscava Seus olhos. Ele estava ali. Acompanhava cada movimento, cada gesto.
- Só o corpo, Jezebel. Não use esse caro sabonete para os seios, mão e pés.
Quando ela acabou, dizendo que acabou, Ele a manda passar em locais específicos.
- Não Jezebel, seu pescoço não recebeu a visita do sabonete... Agora, por favor, (sempre com educação e bons tratos) passe na lateral do tronco.
- Não, Jezebel, de baixo para cima... Isso. Assim você colabora com a drenagem linfática e massageia a pele com a finalidade de aumentar e melhorar a circulação.
Falava com propriedade e por ser homem, ao dominar tal tema, constrangia a submissa. Sem saber o que fazer, ela pedia desculpas e obedecia.
- Por favor, não peça desculpas, esses conhecimentos não são para qualquer um.
Ela acredita que tem que revidar e não ficar calada.
- Realmente eu não tenho tempo para aprender essas coisas, Senhor. Tem outras urgências.
- Oras, Jezebel... Ignorarei o fato de ter me chamado de desocupado e seguirei por outro caminho com uma pergunta: Quer dizer que por trabalhar, não precisa se cuidar? Virou européia, mulher? Se enche de perfume para livrar-se da obrigação do banho?
- Não Senhor, o que eu falei foi outra coisa.
Ela não acaba de falar e a cane vai em sua bunda. Ela não esperava e saltou, afastou-se e olhou com ódio.
Ele sorriu. – Então fora ser desocupado, agora também sou mentiroso? Volte aqui, Jezebel, quero bater mais.
- Senhor, em nossas conversas eu falei que não era masoquista.
- Pois é, Jezebel (Ele vai na direção dela e bate mais algumas vezes de forma seguida. A cana assobia no percurso entre o ar e as pernas de Jezebel) eu lembro muito bem que eu falei que era sádico.
Ela fica muda, sente a dor, se curva para amenizar a ardência, olha para Ele e resolve não debater, afinal Ele mostra que além da força, tem disposição para usar a ferramenta mais temida no meio.
- Uma bela maneira de começar, hein!
Ela não segura a língua e solta a dor em uma frase.
- Uma poesia não tem começo, meio ou fim dado pelo poeta. Quem afere, confere e fere isso é o leitor, Jezebel. Se você, minha parceira nessa viagem, diz que comecei bem, agradeço (se curva com ironia), mas ainda não comecei. Você nem mesmo acabou seu banho.
- O que o Senhor quer que eu faça. Ela tenta mudar o rumo.
- Caixa 15, por favor. Ela se afasta, abre a caixa, sem poesia pega o sabão que está lá e espera a ordem. Não ouve nada e se vira.
Exatamente nessa hora recebe um jato de água bem em seu rosto. Forte, preciso e que a afoga por avos de segundos.
Demétrius estava sentado, afastado. Seus passos não eram ouvidos, mas seus atos percebidos.
- Lave os pés, submissa! A voz foi firme.
Assim ela o fez.
Olhava-O e fazia, perdia o equilíbrio e fazia. Se fazia.
Na cabeça de Jezebel tudo aquilo era novo. Sim, já havia jogado algumas muitas vezes, mas aquela meticulosidade, aquele estilo, aquela oscilação, aquela troca de valores, segurança e ritmo eram únicos. Ela debutava.
A água surgia comumente após o uso do sabonete, a mangueira ficava discretamente escondida em suas longas e magras pernas cruzadas.
- Caixa 21, Jezebel.
Ela abriu, outro estilo de sabonete, outro cheiro, outra textura, outro brilho. Ela se virou de pronto e logo Ele ordenou que ela usasse nos seios. Somente nos seios.
Aquela dança de sabonete, aquele observador a sua frente poderia dar a sensação de presídio, de punição, mas Jezebel sentia frescor, sentia-se cuidada como nunca. Era um momento dela. Não haviam telefones tocando, pessoas pedindo, cobrando ou querendo pagar. Os íntimos ficaram de fora, tão de fora que ela estava só. Como nunca ficou.
- Feito! Ele disse levantando-se.
Agora vamos testar as minhas habilidades massoterapêuticas, Jezebel.
A caixa 25 era imensa. Ele mesmo a abriu. Uma maca foi tirada lá de dentro. Com uma habilidade pouco vista, Ele abre a maca e pede que Jezebel deite com a barriga para baixo.
Ele usa os produtos que estão nas caixas 22 a 24.
Ela fica apreensiva, não sabe o que vem.
Ele prepara uma combinação de produtos na cubeta e os leva a seu corpo.
Jezebel tem um misto de medo e prazer. Os produtos eram para uma esfoliação e ao mesmo tempo que ela se deliciava com Suas mãos subindo de suas pernas até seus glúteos imaginava que algo viria.

Os produtos pareciam uma lixa, firme, mas as mãos daquele Senhor eram suaves cadenciadas e bem vindas.
Quando ela menos esperou, recebeu um pingo de vela. Mesmo com seu corpo molhado a vela ardia, queimava, ia.
Vela, esfoliação, vela, esfoliação, cane. A maca tremia com Jezebel, as luzes foram diminuindo, a água banhou seu corpo. Com uma toalha, Ele secou suas costas.
Ela ouviu barulho de luvas sendo manipuladas e postas. O rasgar de plásticos era inconfundível.
- Por favor, Jezebel, fique de quatro.
Ela arregalou seus olhos, mas Ele não tinha acesso a essa visão.
Quando ela estava completamente de quatro, Ele tira da embalagem um anuscópio e começa a introduzir em seu ânus.
Devagar, foram-se todos os milímetros.
Devagar, Jezebel misturava desconforto com prazer. Aquilo era incomum, mas era bom. Era sujo, mas dava prazer.
Ele abriu um pouco mais o anuscópio e além de admirar tudo que havia lá dentro ainda comentava. Isso era o pior para ela.
- É, Jezebel, seu ânus é rosinha por dentro, mas ainda há restos aqui. Vejo bolinhos de restos fecais.
Claro que ela não respondia nada. O calor que fervia seu corpo diante de tais comentários era emudecedor. Não havia como falar.
- Aqui! Bem aqui do lado (Ele falava, apontava e tocava), tem os anéis que quando o pênis toca na vagina dá mais prazer a mulher. Hummm, estou entendendo agora.
Ela não movia um músculo.
- Ah, Jezebel! Você não tem como ver, claro! Peraí.
Ela não queria ver, em definitivo, ela não queria ver!
Os passos afastaram, mas logo voltaram com um barulho de rodas juntos.
Uma mesinha auxiliar, dessas que tem em consultório trazia uma pequena TV preto e branco. Logo Ele a ligou e passando algo frio no ânus da Jezebel, logo ela podia ver seu próprio ânus na TV à sua frente.
Ela não acreditava naquilo e acreditava menos ainda no que sentia. Era prazer. Um prazer ainda não sentido, vivo, presente, único.
Ele apresentava um ar que misturava a empolgação de uma criança e a perspicácia de um sádico.
- Olha, Jezebel! Aqui temos Cripta Anal, a Linha Dentada. Falava, apertava, puxava e batia no aparelho de acrílico que fazia com que seu ânus ficasse aberto.
Ela constrangia, mas intimamente gostava daquele exame minucioso.
Só não sentiu conforto quando sentiu algum líquido entrando.
- Ah, Jezebel, nem avisei. Me desculpe. Preparei um enema de camomila para fazer uma limpeza básica em seu rabo.
O líquido estava pendurado em uma vara parecida com as de soro, mas o balde era grande e não havia líquido que enchesse Jezebel.
Ela teve uma aceleração sem igual em seu coração, sua pele ruborizou, seus ombros fecharam, seus cabeços arrepiaram e sua pele vertia tanta água que não dava para chamar de suor e sim de chuveiro brotador.
Muita água entrou. A mangueirinha foi tirada do buraco aberto pelo anuscópio, a vara foi tirada de perto. Não demorou para Jezebel começar a reclamar de leves cólicas. Mais dois, cinco, sete, nove minutos e o anuscópio foi retirado de si.
- Olha Jezebel, é só descer com cuidado e ir ali naquele cantinho, dá para ver a latrina ali?
Ela não acreditou que teria que fazer aquilo na frente dele, de cócoras.
- Olha Senhor, na sua frente eu não consigo.
- Quem disse que não? Por favor, desça e vamos ver como “ele” se comporta, Jezebel.
Totalmente ruborizada ela desce. Vai agachada até aquele vaso sanitário, com marcas para os pés, posto no chão.
De cócoras, a cólica fica mais forte, porém ela olha para Ele e segura até que não agüenta mais e a vergonha é o alívio de sua dor. Solta.
O barulho é ensurdecedor para ela, Ele sorri, se aproxima, olha, faz graça dizendo que mesmo com a camomila ainda fede muito e pega a mangueira e dá mais um banho em Jezebel. Ela aproveita o barulho da água e solta o que ainda resta. Um alívio sem igual. Na hora não, mas no futuro aquele enema será motivo de muitos orgasmos solitários de Jezebel.
Ele pede para ela pegar uma mangueirinha que está próximo a ela e findar a assepsia.
Ela o faz, recebe uma toalha e a ordem para voltar para a maca.
- Agora de barriga para cima Jezebel.
Constrangida, sentindo-se violada, sem ritmo e quase odiando aquele Senhor, ela deita de barriga para cima.
Sem demora a maca recebe adendos que a transformam em uma cama ginecológica. Suas pernas são afastadas e levantadas.
As luvas foram trocadas, o aparelho agora é um espéculo vaginal. Tem a mesma função do anuscópio, porém é para uso em local diferente.
Ele introduz, com calma, olhando dentro dos olhos dela, ela gosta daquilo e abre – mais – levemente as pernas.
Após a introdução Ele mexe na base do aparelho e vai abrindo-o e junto afastando os lábios.
Ela tem uma sensação de invasão, o frio entra na fenda nunca tão aberta, nunca tão exposta, nunca tão.
A vergonha se apresenta na tela do olhar Dele. Bastava olhá-Lo para sentir mais frio, mais calor, querer não estar ali. Cadê o botão “invisibilidade on”? Ela se perguntava.
Ele enfiava um pouco mais, a olhava, sorria de canto de boca, abria mais o aparelho.
Quando ela virava o rosto, fechava os olhos, Ele a chamava e comentava algo.
- Seu grelo é assim, Jezebel.
- O rosado de seus lábios é interessante, mas eles, se comparados ao tamanho do clitóris, são pequenos, né?
Ela não conseguia responder, quando muito fazia boca de sorriso. Os dentes não vinham, mas os lábios moviam para o lado.
Interessante, Jezebel, sua gruta está inundando.
Ela se perdeu por completo. Seu rosto era passivo, mas seu corpo estava ativo.
Ele olha bem lá dentro e faz um minucioso relato do que vê. Ela constrange, mas gosta.
- Jezebel, por favor, estica seu braço e abre a gaveta 13. Essa que está com um X.
Ela atende ao pedido Dele com naturalidade, mas assusta-se ao puxar algo pequeno, mas pesado.
- Prendedores, meu amor. Trouxe para você, acredita?
- Ai, meu Senhor! - Ela apavora. Odeia prendedores, não tem resistência para eles.
Ele sorri, chega perto de seu rosto, alisa seus cabelos, beija-lhe, suavemente os lábios e pede. Sim, Ele pede, com carinho e paciência. Mas com uma ironia sem igual.
- Ah, meu amorzinho, deixa eu colocar só um pouco, vai... Juro que coloco só um pouco, tá?
Ela percebe a ironia, mas encanta-se. Como aquele homem pode brincar tanto com ela? Como pode ser tão sádico a ponto de seduzir a mulher afim de dobrar a submissa.
Ela não respondeu e Ele foi ajustando os prendedores e alinhando para colocar.
Foram os dois ao mesmo tempo, mas antes Ele se afastou. Mirou nos seios, mas qual fotógrafo que faz tudo olhando para o visor da câmera, olha em sua gruta.
- Aiiii! Puuuuuuttta que o pariu!
Ele olha bem dentro de seus olhos, não é um olhar de reprovação. Ele curtiu cada pedacinho daquele grito real.
Jezebel tem calafrios por todo o corpo, se contorce. A dor não era seu prazer.
Antes que ela conseguisse se refazer, Ele pega um outro prendedor e coloca em dois de seus dedos. Um de cada pé.
Ela já não sabe se dá atenção aos mamilos ou aos dedos. Para completar Ele quebra os gemidos de dor.
- Você está encharcada, submissa. Lindo de ver.
Mais uma vez Ele pega a câmera, sintoniza, coloca a TV ao alcance dela e a mostra. Jezebel se fascina, a dor não vira prazer, mas é esquecida. Está ali, mas qual criança cansada, não fala nada.
Ela vê, pela primeira vez, seu próprio gozo, sua vulva inundada, vertendo leite branco, qual homem, pelas paredes de si.
O prazer é enorme e aumenta ainda mais quando Dom Demétrius coloca uma pequena cápsula vibradora bem no cume. Ela não suporta, geme, viaja, vai e volta àquele lugar.
Segura firme na maca, rebola um nada sequer.
Com a mão que está livre, Ele coloca um separador bucal em seus lábios. Ela gosta daquilo, se sente vulnerável, volúvel, dada.
Ele coloca uma pequena pedra de gelo em sua boca, e ela fica num engasga não engasga sem igual.
Não sabe se atende aos sinais de dores de seu corpo, ao prazer que a cápsula gera em sua vulva ou ao gelo que a asfixia.
Algo louco, sem igual, mas sentido com intensidade.
Ele aproxima Seus olhos bem próximos aos olhos dela e serenamente dá o comando com força e maestria.
- Escuta, Jezebel. Falarei uma vez só. Não duas, não três. Só uma.
Ela não O ouve, mas entende o que Ele diz. Acena com a cabeça.
- Goza, submissa! Goza, mulher! Goza para mim e não mais para nenhum outro. Goza que te quero ver verter Meu prazer.
Ela assusta, se contorce e sai de si em um gozo nunca antes sentido. A viagem foi longa. Como Ele vai tirando os prendedores aos poucos, não há vontade de voltar. O prazer só aumenta.
Demétrius pega uma vela (sempre de algum lugar, sempre sem preparar nada, parece que tudo fica pronto e quando Ele quer, vem). Não pinga, olha para Jezebel, olha para a vela.
Coloca a vela em um apoio ao lado da maca, tira a cápsula de cima dela e, com movimentos rápidos, imobiliza suas mãos. Um lado, algema, do outro lado, algema.
Na volta para o lado que estava, pega um borrifador. Ao chegar, pega a vela.
- Você tem medo de fogo, Jezebel? Sua voz é serena, seu olhar fixo e no ar uma aura sádica de quem não tem medo do medo que gerará.
Jezebel não intenta o que poderá vir, mas amedronta-se.
- Até hoje, Senhor, não tive medo de fogo.
Sua voz é perdida, ainda não voltou por completo.
- Que bom, mulher, o fogo é uma das descobertas mais antigas e que ainda fascina. É a única entidade que aparece em todas as mitologias e tem passe livre em todas as seitas, filosofias e religiões, é um marco, Jezebel.
Os pensadores vêem nela a luz do saber, os filósofos a luz da metáfora, as crianças o bailar livre, os desesperados a espera do renascimento da fênix, as mulheres o filho.
O fogo é mágico, Jezebel. Na temperatura certa, faz barro virar pedra, cerâmica e luz. Só ele, soberano, forja a espada de um samurai.
Ele se cala, olha dentro dos olhos de Jezebel e borrifando na direção da vela cria uma labareda que a faz pular na maca.
Ela não consegue, pois está presa. Ele repete mais uma, duas, várias vezes e ele se contorce.
- Ué, Jezebel, achei que não tinha medo...
O afastador bucal não a deixa argumentar, Ele ouve grunhidos, tentativas de fala.
- Ah! Você está presa e não pode apreciar o fogo? Entendi.
Ele larga o fogo, solta Jezebel e com a voz tão firme quando doce diz – Fica, cão! Fica!
Seus olhos hipnotizam, ela não ousa se mexer, mas a labareda vai bem próximo a ele. O espéculo em sua vagina incomoda, o afastador incomoda, a louca vontade de ir ao banheiro a incomoda, mas ela já sabe como é o banheiro e não tem motivação para ir.
O fogo avança em sua direção, ela arregala os olhos, tem medo. Ele fica com os olhos fixos, brilhantes. Psicopaticamente brilhantes, um olhar de quem não teme, que ama o medo daquela mulher. Seu peito estufa, parece que o medo dela O abastece.
Ele coloca seu falo para fora. Grande, rijo e mostra o tamanho de seu prazer.
Do extremo do medo, Jezebel vai ao estremo do prazer.
- Se toca, Jezebel. Se toca.
Ela tenta falar algo, não consegue, Ele alinha fogo, borrifador e seu corpo, ela se fasta um pouco, tenta falar de novo.
- Tire isso da boca, mulher. Não vê que eu não entendo esse idioma e quero te queimar?! Ele quase grita, está visivelmente excitado com a possibilidade de queimá-la.
Ela tira o afastador da boca.
- Senhor, por favor, estou com medo.
- Eu também, Jezebel, mas alguém tem que fazer isso. Só o fogo poderá purificar sua alma.
- Aí, meu Deus...
Ela se esquiva, Ele não borrifa, mas alinha, mira, aponta, acerta, espirra álcool nela.
- Eu mandei se masturbar, mulher! Fala alto, mostra aparente descontrole, ela fica completamente arrepiada, suas pernas abertas, ela meio sentada, sem apoio, tenta, mas o espéculo atrapalha.
- Tira! Tira o espéculo, porrraaaa!
Ela até tenta, mas ele não sai.
Demétrius cai na gargalhada. Um riso estridente, gargalhada de psicopata, solta, no ar.
Uma labareda!
- Fogo!!!
Ele grita e gargalha. Ela olha para Ele, olha para o espéculo e de um salto arranca tudo. Quase se traz junto, quase se rasga.
Ele? Ri mais forte e mais alto.
As labaredas não param, cada vez mais próximas de Jezebel. A mão que ia na vulva tenta parar o fogo, mas o fogo não se deixa pegar, passa por sua mão.
Ela faz um gesto de que foi queimada e Dom Demétrius pára para ver.
- Cadê a mão? Queimou?
- Não, Senhor. Senhor, por favor, vamos parar? Que horas tem? Ela está nervosa, tenta conversar.
- É a minha hora, Jezebel! A trouxe até aqui, seu tempo. Deixei que fizesse aquela palhaçada de entra não entra, aceitei seus ares de “puta ofendida” ao dizer que eu não deixava margens para negociação. Oras! Se quer me servir, quer negociar o que Jezebel? E as labaredas não param. Cada vez maiores, cada vez mais próximas, cada vez mais fortes.
- Senhor, eu tenho medo!
Ele começa a dançar e cantar a musica do Raul, Medo de Chuva.

"Eu perdi o meu medo
O meu medo, o meu medo da chuva
Pois a chuva voltando
Pra terra traz coisas do ar."

Cantava segurando vela e borrifador. Jezebel olhava apavorada. Como Ele conseguia tamanha naturalidade naquela hora?
Pensou em pedir para ir embora, despensou, repensou.
- O Senhor ficaria chateado se eu pedisse para ir embora?
- Eu?! De modo algum, mas... a que preço? Ele não parou de dançar, fazia como se ainda ouvisse a música, voltou a soltar as labaredas para o lado de Jezebel e ela, que já estava quase fora da maca, sobe correndo e se encolhe como quem vê um rio de baratas no chão.
- Como preço, Senhor?
- Pois é, eu não te contei. Aliás, eu não te contei nada, né? Chagamos aqui tão apaixonados, tão envolvidos em nós mesmos que nem negociamos. Ele parecia louco. Agora abre a porta de número 19 e pega um cacho de uvas. Come qual um louco de fome. E fala com a boca cheia.
- mas eu sei tudo e posso te passar as regras aqui desse mundo. Aquele que sai antes de eu mandar embora paga com uma tira de couro, umas mechas de cabelo e todas as unhas do corpo, quero dizer, todas as unhas dos pés e das mãos. Bem, se tiver em outro lugar, terá que dar também.
Ela não fala nada. Olha-O fixamente. Medo, pavor, desespero.
Mas, olha, Jezebel, (Ele a abraça. Em uma mão a vela e a uva, na outra o borrifador) eu posso fazer uma coisa legal com você.
- O que, Senhor?
Ele a beija, dado a proximidade, enche a boca de uva, quase queima seus cabelos e propõe algo como quem conversa com uma criança e oferece um brinquedo pela chupeta.
- Meu amor, olha só. Eu sei que tira de couro é muito, entendo que cabelo é coisa séria e mais ainda que unha de mulher não cresce logo, mas... (afasta-se e enche o peito como um vendedor em praça pública), eu posso trocar tudo isso por um banho de fogo. É! Sempre quis ver uma mulher pegando fogo (não dá espaço para ela falar e segue). Faremos assim: eu te encho de álcool, lanço a vela e logo depois eu ligo a mangueira com água. Nem vai te queimar. O que acha?
Ela pensa que aquilo não pode ser verdade. Passa a mão nos cabelos, sente o fogo queimando sua pele, passa as mãos rapidamente no braço e sente a sedosidade deixada pelos sabonetes.
Não, ela não sabe o que responder. E quando a sua confusão mental atinge o ápice, Ele joga tudo para o alto e a conforta: - Calma, Jezebel, eu hein! Estou brincando, pô.
Qual uma pessoa que acabara de receber um espírito, Ele muda da água para o vinho.
- Pára com isso, vai. Quer ir embora, mesmo?
Ela pensa, sorri, vê o papel de bobo da corte que acabou de fazer e sorrindo começa a chorar com força e descompasso.
Ele compadece. – Ah, não Jezebel! Tá chorando porque acha que eu a mandarei embora? Que isso, boba. Você pode ficar, é minha convidada.
A abraça bem apertado, ela chora mais ainda.
Ele olha dentro dos olhos dela. – Acabou... essa parte acabou. Por que chora?
Ela é irônica e tenta mostrar que está tudo bem com sua resposta.
- Eu gosto de chorar, Senhor, é quase um fetiche. Esquenta não.
- Pois é... (ele compra a brincadeira), uma tia minha dizia que só chorava quando não dava para sorrir. Mas, porra, ela não conseguia sorrir nunca.
Ambos caem na gargalhada e Ele a abraça com força.
Passados alguns minutos abraçados, Ele mostra um banheiro ao lado de onde estão. Pede que ela tome um banho de cinco minutos e volte com o vestido que está lá dentro.
Ela pula da maca, sorri, olha para Ele, sorri de novo.
- Posso perguntar uma coisa, Senhor?
- Se falar besteira voltamos para o jogo.
- Como o Senhor consegue ser tão sádico?
- Eu?! A sádica aqui é você, Jezebel.
Ela sai sorrindo e falando sozinha, que tem somente cinco minutos.

Já eram mais de nove horas da noite quando aquela sessão ininterrupta de tortura, banhos, torturas findara.
Ela volta linda do banheiro. Vestido, maquiagem, salto altíssimo.
Um vestido longo, rendado, transparente, creme com verde. Ao descrever pode parecer estranho, mas era lindo. O corpo de Jezebel estava sedoso, ela gostou do vestido.
O usou com prazer e estava admirando-o.
Andou alguns passos, chegou até Ele e com Ele logo estava “na sala” ao lado.
Diferente da sala de banho, ali havia pouca luz. Muitas sobras.
Uma sala ampla, com uma mesa grande. Madeira nobre, vidro, luz de velas com lustres de cristais. A música era um jazz que tocava fundo, bem ao fundo.
Ela se impressionou com tamanho luxo. Uma mesa impecavelmente posta. Mas quem a arrumou?
O fato de, visivelmente ter mais alguém ali a incomodava. Até a mesa podia ser impressão, mas a mesa tão bem posta, e o Senhor não ter saído de perto dela, deixava claro que tinha mais alguém ali.
Quando ela ia sentar-se, Ele pediu que deixasse a pele tocar o estofado da cadeira. Algo comum no meio, mas ela ficou visivelmente constrangida.
- Por favor, Jezebel... Deixe sua pele tocar a pele da cadeira que se segura o corpo.
Ela não segurou a língua e foi direta.
- Senhor, tem mais alguém aqui?
Ela tremia em sua voz, O olhava firme, Ele sorria.
- Sim, Jezebel.
Ela solta o ombro em alívio, mas não durou muito, pois Ele continuou:
- Tem todas as personas que habitam a mim e a você.
- Não é disso que falo Senhor...
Ela é interrompida:
- Vamos comer, não quero que esfrie, Jezebel.
Ela se arruma para comer quando sente a cane levantar seu vestido. Pelo vidro da mesa pode ver que era uma vara fina mas firme o suficiente para agüentar todo aquele pano.
Olhava para Ele, comia, sentia a cane e molhava. Ela gostava daquele jogo.
- É Jezebel... Tem muitos Senhores que mandam submissas comerem em vasilhas, no chão.
- O Senhor quer que eu vá para o chão?
- Se quisesse teria mandado, não?
- Sim, Senhor. Teria, Senhor.
O jantar foi sem novidades. Comeram e conversaram por curtos 70 minutos.
Jezebel ainda comia quando Ele levantou discretamente, colocou uma coleira nela e a puxou para se levantar.
Ela levou um susto, levantou de pronto.
- Todas as vezes que eu levantar, todos se levantam.
Ela não conseguia falar, com os olhos arregalados apenas maneou a cabeça.
Foi levada ao pequeno tanque.
Recebeu a ordem de escovar os dentes e quando abaixou para pegar escovas recebeu um pacote em seu rosto e o comando para abrir.
Era uma escova usada em cachorro e um creme dental de baixíssima qualidade e péssimo sabor. Ou era de cachorro ou era medicinal. Não podia ser comum.
A salada, o peixe, as torradas quase voltaram.
Enquanto escovava, Ele batia em sua bunda com as mãos. Chegou a levantar seu vestido, mas somente olhou e bateu mais ainda.

(continua na próxima semana? - durante a semana volto para revisar e ilustrar.)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Dom Demétrius e Jezebel – a insubmissa [Parte 003]

Dom Demétrius e Jezebel – a insubmissa [Parte 003]

Pensava, refletia. Quero dizer, buscava pensar, tentava refletir. Sua mente era confusa demais, estava confusa demais para elaborar o novo, seu signo do zodíaco dizia que ela era uma pessoa que não elaborava, resolvia tudo no impulso. Era o fogo do momento.
Vindo de dentro do corredor, um forte som de sino empurra a todos naquela imensa porta. Jezebel assusta-se e dá uma salto para trás, Dom Demétrius nem se mexe. Olha para ela, assiste a seu salto, olha para dentro, dá um leve sorriso como quem sabia o que havia e faz seu derradeiro discurso:
- A grande hora chega, Jezebel. Não a mandarei entrar, não me responsabilizarei por seus atos e nem fomentarei o seu prazer.
É agora, ou fica ou saí.
- Eu não dou conta. Eu saio, Senhor e peço que entenda a...
Quando ela ia concluir seu discurso Ele a interrompe.
- Por favor, Jezebel, se fica tem tudo. Conversa, discurso e argumentações, se sai sai sem nada, não precisa nem mesmo justificar sua ida. Por favor, se vai, não se demore.
Ela levanta sua cabeça, olha dentro dos olhos Dele, o ar era um misto de raiva, sentimento de não acolhida, afinal ela só queria conversar para ter um pouco mais de segurança, indignação.
O ódio lhe subiu à cabeça e Jezebel teve vontade de cuspir na cara Daquele homem, mas não o fez. Uma força a impedia de chegar mais próximo que um metro dele, sua boca trincou de uma forma tão inusitada que nem ela entendeu. Talvez fosse melhor.
Ela virou-se, olhou-O mais uma vez. Queria que Ele a resgatasse do limbo de sua atitude, queria que Ele respondesse por ela. Ele não o fez, em verdade nem mesmo se moveu. A viu ir porque aquela era Sua posição inicial.
Alguns muitos passos e ela estava na esquina. Olhou para trás mais uma vez. Ele estava mexendo no pulso, talvez no relógio e não a viu olhar.
Uma enxurrada de sentimentos e emoções tomou conta daquela mulher. Seu corpo tremia, suas pernas bambeavam, sua cabeça parecia explodir, seu coração disparava, seu peito doía, suas mãos suavam, sua espinha mesclava calor, muito calor, e frio, muito frio, sua roupa estava ensopada. Ela correu. Mais de cem metros e estava jogando-se no carro. Um lugar familiar...
Ali, presa ao volante, pernas soltas, bolsa ao lado ela desfez seus grãos de emoção, qual uma tempestade no deserto ela soltou-se grão por grão, todos ao mesmo tempo. O sol ainda estava alto, mas iniciava seu procedimento de descida.
No carro ela se encontrou com ela. Teve vontade de ligar para um ou outro, mas o que dizer? – Sai com um sádico e não tive coragem de visitar sua masmorra?
Se isso fosse dito para alguém de fora do meio, ela seria taxada de louca, desequilibrada e ainda teria que contar toda a história.
Se isso fosse dito para alguém de dentro do meio, ela seria taxada de louca, desequilibrada e ainda teria que contar toda a história e... explicar como ela, tão renomada, tão forte, tão especial abriu mão de um dos maiores nomes do meio. Ele é o sonho de consumo de 9 entre cada dez submissas, ela O teve, bem ali e – frouxa – correu.
Ali. Ela chorava, pensava no mundo muito mais que em si, não pensava nas possibilidades, mas pensava em como Dom Demétrius foi injusto. Não custava nada conversar um pouco. Ela precisava de conversa! Como um Dominador tão experiente pode deixar passar algo tão básico? Recuperando o fôlego ela pensa em como puní-lo. O que poderia dizer nas listas, nos chats, nos grupos para mostrar a todos quem é esse pseudo-Senhor que se diz Dominador, quando na verdade é um frustrado que só quer usar e abusar de submissas.
Ele veria com quantos paus se faz uma canoa!!!
Feito isso, pensado isso, ela enxuga o rosto, recupera o fluxo de respiração, centra suas ideias e com a ideia de vingança se maquia, arruma os cabelos e liga o carro para partir.
Junto com as luzes padrão do carro, o rádio liga e o CD do Chico volta a tocar. Uma música ainda está em seus primeiros acordes.



Teresinha
Composição: Chico Buarque/Maria Bethânia

O primeiro me chegou como quem vem do florista
Trouxe um bicho de pelúcia, trouxe um broche de ametista
Me contou suas viagens e as vantagens que ele tinha
Me mostrou o seu relógio, me chamava de rainha
Me encontrou tão desarmada que tocou meu coração
Mas não me negava nada, e, assustada, eu disse não

O segundo me chegou como quem chega do bar
Trouxe um litro de aguardente tão amarga de tragar
Indagou o meu passado e cheirou minha comida
Vasculhou minha gaveta me chamava de perdida
Me encontrou tão desarmada que arranhou meu coração
Mas não me entregava nada, e, assustada, eu disse não

O terceiro me chegou como quem chega do nada
Ele não me trouxe nada também nada perguntou
Mal sei como ele se chama mas entendo o que ele quer
Se deitou na minha cama e me chama de mulher
Foi chegando sorrateiro e antes que eu dissesse não
Se instalou feito posseiro, dentro do meu coração

A música a hipnotizou, não conseguiu dar a partida em seu bólico, não conseguiu dar a partida em si mesma. Travou a mulher, travou a submissa, travou Jezebel.
Durante a música ela chorou uva-passa, teve corizas de carvalho com pimenta e viu um céu mudar de cor. Do azul límpido passou por um vermelho-constatação e chegou a um negro-noite-lúcida-porém-misteriosa. Mito!
Tudo passou por sua mente e se há dois minutos atrás ela o odiava, agora sentia que precisava voltar para ao menos pedir desculpas, afinal Ele a acolheu, foi cortês, ofereceu sua masmorra, não a obrigou a entrar, pelo contrário, deixou a parte dela nas mãos dela.
Ele foi sábio, ela foi ignorante. O jogo era Dele, em sendo submissa ela não teria o direito de querer se impor, de querer contrapor, de querer.
Sua mente girava mais que núcleo de furacão. Em verdade, não girava na base. Ali era neutro, girava no alto e, por descuido, talvez, levou tudo. Até o que não devia levar. Talvez.
Desligou tudo, desceu do carro correndo, um sapato lhe saiu do pé, mas qual Cinderela não tem tempo de voltar e pegá-lo.
Ao virar para o corredor de onde estava a porta vê que Dom Demétrius está no mesmo lugar, na mesma posição.

Ela, no primeiro instante, se alegra o peito com rosas colombianas, diminui o passo e ao chegar na frente Dele, se joga de joelhos, coloca as duas palmas das mãos para cima, enfia sua cabeça entre as pernas, coloca seu quadril bem para o alto e chorando pede desculpas.
- Por favor, Senhor, me desculpe. Fui imatura, infantil ao não reconhecer sua autoridade. Vim pedir desculpas, pois eu não deveria ter saído daquele jeito.
Ele a olha por cima, volta a conferir o relógio e sorrindo faz seu discurso andando. Ao que parece faz uma revista. A mesma que faria o futuro proprietário de um animal qualquer.
- Veio pedir desculpas, ou pedir para entrar, Jezebel?
Ela fica muda.
- Já ficou muda tempo demais, Jezebel. A noite caiu e as bestas serão soltas para protegerem o terreno. Nem eu as controlo. Ou entramos ou saímos. Me responda, por favor.
Ela não entende nada, mas um frio passa por sua espinha, a bela posição só é bela, a deixa incomodada, não somente o físico, mas igualmente a mente. Sem dúvidas ela queria impressionar, e sem outras dúvidas, Ele não ficara impressionado. Sua frieza era realmente Sua.
- Senhor, eu queria conversar, preciso conversar.
- Quando verá que o jogo é Meu e não seu, Jezebel? Aqui o tempo e o espaço são modos manipulados por mim, em meu mundo eu sou Deus e Diabo, sou plebe e corte, sou Rei e súdito, sou vento e poesia, sou o palácio e o cortejo, as cores e os vendavais. Sou sol, lua e noite. Não quero e não serei dia. Nunca, Jezebel e creia: o meu nunca pode ser nunca, hoje ou mesmo amanhã e os meus hojes e amanhãs podem nunca ser. Tudo é Meu e nada será seu. E ainda se orgulhará por, ao Meu lado, não ter nada, uma vez que somente Eu tenho tudo.
Ele fala isso e dá um tapa tão forte em sua bunda que ela quase cai. Aquilo foi o suficiente para a alma de mulher ser sacudida e a alma submissa descer para agradecer o a última oferenda e encomendar mais uma em qualquer encruzilhada.
- Se tudo que está a vista é Seu, quem sou eu para não seguir o rio da verdade?
- Você é a mina da vaidade. Constante até o momento em que um posseiro qualquer te canaliza para a cocheira e passa a dar de beber somente aos bois.
- Sim, Senhor, sou o que sua visão diz que sou.
Claro que tudo aquilo não passava de um jogo de poder. Ele não acreditava nas palavras dela, ela buscava um meio de derrubar os discursos Dele. Esse era o prazer dos desencontrados até o encontro final.
Ele, sem dar atenção a fala dela, segue seu discurso.
- É Jezebel... 43 minutos é muito tempo para reconhecer a grandeza de um Imperador. Sim, por direito e conquista sou o Imperador de mim mesmo, Aquele que é Dono e Senhor de tudo que pode ser visto.
Mas a esperei, sabia que seria frouxa demais para entrar de pronto e esperta demais para ir embora ao primeiro sinal do sino. Outras foram, outras entraram, nenhuma ao primeiro convite.
Levam-te Jezebel de Bourbon Caspp!
Ela levanta confusa, pois saber o seu nome era aceitável, mas sabê-lo todo? Sem contar a arrogância de saber todos os seus passos. Ela quase morre e Ele se diverte?! Ele sabia o que ia acontecer a todo instante, ela foi a tola.

Já de pé, Ele faz mais uma revista.
- Jezebel, perguntarei mais uma única vez. Não quero demora na resposta, não quero nada além de um sim ou não e em caso de não quero que se vire, entre no seu carro e se vá. Fui claro, Jezebel?
- Muito claro, Senhor.
- Jezebel, você quer entrar?
- Quero sim Senhor.
- Então entre, Jezebel.
Ela congelou. Até ali a leitura que ela fizera era que, diante de um sim, Ele faria um discurso e a mandaria entrar, mas Ele não era linear, não existia padrão, não existiam padrões.
Ela respira fundo, entra, Ele a empurra, ela dá alguns passos e assusta-se com o forte barulho que a porta fez ao ser fechada. Mas por quem, se Ele estava exatamente ao seu lado?
Tudo escurece, Ele segura firme em seu braço para que ela não saia correndo, não surte e fala manso – acalme-se e logo seremos luz.
Aos poucos as luzes vão aumentando, parece um dimmer, um controlador. Bem devagar ela vê que o corredor é mais extenso do que se via lá de fora.
Ao ouvir um sino vindo bem de longe e bem fraco Ele a solta e pede que caminhe.
Ela percebe as paredes úmidas, frias, cor de bege, bege de pele de árabe queimado de sol e deserto, de bege, de bege rosa, de bege marrom, de bege vermelho, avermelhado e até de um bege bege.
O piso erra irregular, feito de pedras e blocos. Horas pedras, horas blocos.
Não houve conversa. E nem dava para, afinal tudo era ao mesmo tempo assustador e encantador.
Ela percebeu algumas leves curvas, algumas leves inclinações. Seu senso de direção era bom, mas não conseguia notar que estava passando por baixo daquela casa enorme, passando por baixo da rua que estavam e seguiam para baixo daquele terreno que estava na frente da casa onde entrou. O terreno vazio e muito bem cuidado era o topo da masmorra em que ela seria usada.
Ela percebe que o corredor tem largura irregular, percebe que foi feito de uma forma que só é possível ver 15 metros por vez, ao final disso a arquitetura sofre alguma mudança que impossibilita a visão.
Uma volta e dão de frente para duas portas de ferro pesado e enferrujado. Uma bem grande, larga e alta, uma de um metro e meio, estreita e com alguns detalhes em alto relevo.
Ambos param.
A porta imensa se abre sozinha, o que a faz acreditar que realmente há mais alguém ali, a pequena se mantém fechada. Como estava.
- Abra a porta, Jezebel.
- Essa Senhor. Ela estava nervosa.
- Não, Jezebel, pode abrir esse aqui que já esta aberta. Ela abaixa a cabeça e faz um esforço sobre humano para abrir a porta.
- Não é força, Jezebel, é vontade. Tenha vontade de entrar e ela se abrirá.
- Mas eu estou com vontade de entrar, Senhor.
- Se estivesse ela se abriria.
Ela abaixa a cabeça mais uma vez e ao se apoiar na porta, ela se abre e ela e arremessa da para dentro.
Ele entra pela maior.
Ela levanta sua cabeça e fica encantada com o que vê.

São cinco grandes salões. A divisão é visual, os símbolos são muitos, os aparelhos de todos os tipos. No centro dois grandes círculos fazem um 8 símbolo do infinito. Nas paredes armaduras, quadros, armários imensos, em madeira escura, lindas cristaleiras guardam de tudo um pouco.
Ele para ao lado dela, pede que ela se levante e observa a vontade. Ela olha a tudo sem se mover, se assusta ao ouvir o fechar da porta, não tem coragem para virar e ver quem fecha.
Os brilhos são variados, coisas em dourado, prateado, vermelho, azuis, verdes, esmaltes de todas as cores, esmaltados de todos os formatos.
- Aqui, Jezebel, trago o mundo para perto de mim. Tenho tudo de todo o mundo. Não falta nenhum continente.
Ela o ouve, mas está fascinada demais para ouvi-lo. A iluminação é feita em lugares com lustres de cristal, em outros com velas e em outros tochas. Um encanto!
Ela a leva para uma parede cheia de azulejos, para a uma distancia que ela não consegue ler o que está escrito nele. Percebe que as letras, cores e tamanhos são diferentes, mas não consegue ler.
- Aqui assinam as que saem vivas de meu mundo. Elas colocam o que querem, do jeito que querem.
Jezebel não se segura e dá um passo a frente. Ao ver os nomes não acredita. Pessoas nunca vistas, mas algumas até suas amigas. Como não avisaram que já haviam jogado com Aquele Senhor? Como?!
Cantária... Fazia o tipo mosca-morta e já entrou aqui?! Ela pensava: eu que sempre me mostrei tão esperta quase fui embora e ela conseguiu entrar e... sair!!!
Gomes? Ele joga com homens? Arrrggg Aquele viadinho é um entojo, mas percebi que de um tempo para cá é outra pessoa, tem sido mais ponderado, coerente e até mais eficaz em suas investidas. Será que isso é obra e graça desse Senhor?
Viu mais nomes, viu mais pessoas.
E poderia ver todos, um a um se não fosse o fato dEle puxá-la para o lado.
Ela vê quadros com fundo branco e fios, pedaços de sujeiras, coisas que ela não consegue identificar.
- Aqui ficam os restos de algumas pessoas. Umas me deram um pedaço de suas peles, outras o pedaço saiu com o chicote e eu os recolhi, outras, eu pedi suas unhas, seus restos e elas me deram.
Jezebel treme e antes que pudesse pensar naquilo, Ele a puxa, mais uma vez para o lado.
Fios de cabelos em molduras. Em algumas muitos cabelos, em outras somente um fio, mas todas com fios. Crespos, lisos, alisados, tratados, naturais, fios. Muito quadros e seus respectivos códigos na base.
- São cabelos, Jezebel. Algumas pessoas não se contentam com o quadro e me dão seus cabelos de presente. Gosto de tê-los em coleção.
Quer me dar seus cabelos, Jezebel? Um fio, uma mexa, todo ele?
Ela esfria, não sabe o que dizer, mas sente um enorme tesão ao pensar na possibilidade de ter algo seu naquela parede. Pediria a caneta grossa, azul e escreverei seu Nick em letra da fôrma para não restar dúvidas.
Pensou mais um pouco, olhou para os quadros e sentiu algo quente subindo de si.
- Mas seriam todos os cabelos ou somente uma mecha, Senhor?
- Por que sempre tem uma pergunta, Jezebel? Por que sim ou não é tão difícil para você.
Ele se mostra emburrado e a puxa para outro canto da masmorra.
Lá havia um paredão semelhante a um banheiro. Ele pegou uma mangueira, pediu que ela ficasse no centro daquela parede e ordenou que tirasse sua roupa.
Ela não sabia onde enfiar a cara. Mas como assim? Perguntava em sua mente.
- Não repetirei, Jezebel. Tire sua roupa, por favor,
Ela tremeu, não sabia para onde olhar, o que fazer, como fazer. Até aquele momento, com todos os Dominadores que jogou, tudo vinha em uma escala lógica. Dava para se preparar, dava para preparar o espírito. Com Aquele homem nada vinha em seqüência, nada era coerente, nada obedecia a um crescendo.
Ela ficou tão vermelha quanto indecisa.
Nessa hora um forte jato de água a pega desprevenida. Sua tamanha força a joga na parede de azulejos azuis, brancos, amarelos e totalmente desenhado. Parecia uma história de banho, mas ela não pensou naquilo. Assustou-se.
A água a sufocou, mesmo na parede não parava de jorrar. Ele tinha o controle e rindo (muito) de seu desequilíbrio dizia - Outros, Jezebel diriam “jogue a trança Rapunzel!” eu digo “tire a roupa Jezebel” e cai em uma gargalhada que mais parecia de criança que de um homem maduro, um sádico de fato.
Jezebel não teve vontade de chorar, teve vontade de pegar a mangueira das mãos daquele moleque e lhe dar uma boas sovas! Porém ainda que infantil, o filho de um rei, embora, menino, ainda é príncipe. Melhor atender e ver se aquilo acaba.
Ela se vira para equilibrar-se e tirar a roupa.
Vez e outra olhava para Ele, o jato estava mais fraco, mas os olhos Dele brilhavam, Ele usava a água para apontar e dizer o que queria que fosse tirado naquela hora.
- Tire essa peça, Jezebel (e a água era direcionada para a tal peça).
- Senhor, vou pegar um resfriado, Senhor.
- Vai nada! Você é cuidada a base de leite de cabra, Jezebel. E essa água ainda está quente. Vai, vira de costas e tira essa peça aqui. E a água era usada como mão.
Mão essa que alisava todo o corpo de Jezebel.
Ela? Sentia-se humilhada em alguns momentos, desejada em outros e, na maioria das vezes, se taxava de louca por estar ali.

(continua na próxima semana?)

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Dom Demétrius e Jezebel - A insubmissa [Parte 002]

Dom Demétrius e Jezebel - A insubmissa

Saíram de São Salvador, a cidade dos Orixás, passaram por Lauro de Freitas e logo Sauípe, e suas praias, um presente aos olhos.
No caminho ela ainda pensou em pedir para parar em shoppings, lojas e similares para comprar algo, mas optou por calar. Aquele Senhor era astuto e se precisasse comprar algo seguramente Ele diria.
Apenas seguiu.
O percurso entre Salvador e a Costa do Sauípe não demora mais que quarenta e cinco minutos. Eles rodavam a duas horas.
- Senhor, daqui para frente é Sauípe, é o Senhor quem tem que dizer para onde vamos.
- Por favor, Jezebel, siga em frente.
- Então não saímos da estrada, Senhor.
- Se “em frente” for sair da estrada, saia, do contrário, se “em frente” for apenas seguir em frente, por favor, não saia da estrada.
Nesses momentos ela sentia um certo distanciamento Dele, mas não conseguia identificar se era por jogo ou algo natural a Ele.
Chegou a refletir se não estava diante de um psicopata que usava o termo Dominador. Nessas horas seu corpo tremia, sua mente mandava voltar, seus pensamentos viravam um caos.
No intimo, o cômodo vinha de sua tranqüilidade, segurança e total ausência de demonstração de não saber o que fazia.
Conversaram, brincaram, sorriram, mas ainda assim Ele parecia distante, ausente. Era como se a conexão Dele fosse - estivesse - em outra esfera.
Um homem que conseguia ler respiração, transpiração, olhar, gestos e até pensamentos. Isso era amedrontador. Ou será que ela quem somatizava tudo e dava-Lhe super poderes?
Ainda assim, se existiam super poderes, existiria algo que os anulasse. Uma fraqueza que fosse. Ela daria uma lasca de seu couro para saber qual era a criptonita daquele super homem, ou qual a identidade secreta daquele Batman.
- Por favor, diminua, Jezebel.
Ela fora tirada de seus pensamentos.
- Encoste à direita.
Era uma sequencia de algumas muitas lojas á beira da estrada, o estilo era de cidadezinha de uma rua só, design impecável, cores sem igual e algumas com bambus em suas portas.
Segundo a crença local o bambu limpa o espírito.
Ela estacionou, sem falar nada Ele desceu de um salto. Andou até a loja de número dois, entrou, saiu, entrou na de número quatro, saiu, entrou na cinco e saiu. Como em todas, com sacolas.
Pelo tempo que permaneceu, tudo estava separado e pronto. Não daria tempo nem mesmo de pagar.
Quando voltava para o carro, todas as lojas estavam com vendedoras em suas portas. Elas olhavam para Jezebel com curiosidade e para Aquele homem com uma certa intimidade. Ou seria desejo? Alegria por terem vendido uma boa quantia? Quem sabe não conta, quem conta é porque não sabe.
Jezebel, uma compulsiva por controle notou e não segurou a língua. – Elas vieram se despedir do Senhor.
- Sim, a elas não precisei ficar horas em chat, MSN e ligar com antecedência para tentar algo.
Bastou, Jezebel irrita-se e não consegue esconder.
- O Senhor é sempre tão seco, rígido e duro assim? Tem sempre uma resposta para tudo e nada o atinge? Tem emoção aí dentro? Ela estava vermelha, verde, rosa-manjericão e mais algumas cores do alfabeto.
Ele se ajeita na cadeira, olha para os lados, se despede da trupe, olha para a frente e como se nada houvesse acontecido manda Jezebel seguir.
- Segue, mulher que teu tempo é minha hora.
A submissa engole a seco, indigna-se ainda mais, porém recobra o centro e segue sem questionar.
Não percebe-se como, mas aquele homem tinha grande poder de persuasão sobre Jezebel. Nem mesmo ela se dava conta disso e talvez esse descuido podia lhe sair caro mais a frente.

Dez minutos se passaram sem que as palavras fossem verbalizadas.
Jezebel sentia próximo seu destino.
Dom Demétrius olhava para o nada, vez e outra sorria visivelmente e isso intrigava Jezebel, mas o que fazer? Perguntar? O Dom havia se mostrado intolerante a perguntas e rápido nas respostas ferinas. Melhor apenas pensar. Melhor apenas morrer de tanto pensar.
O sol era um algoz e mesmo com ar condicionado sua força se fazia presente.

- Por favor, entre no próximo condomínio, Jezebel.
- A direita ou a esquerda, Senhor.
- No próximo, independendo do lado que esteja esse próximo. Aparentemente a resposta pararia por ali, mas Ele rigidamente e visivelmente irritado seguiu: - Quando desenvolverá o entendimento de que obedecer é somente obedecer? Quem comanda dificilmente dá menos informação do que o necessário. Cabe ao comandado entender que é só obedecer, seu papel é aquele.
- Eu entendo Senhor, mas estou dirigindo e preciso me preparar caso a entrada seja do outro lado.
- Oras, sábia, astuta, perspicaz e inteligente submissa (fala com ironia), sendo eu o comandante, não seria comum, se fosse do outro lado, o comando ser “se prepare para entrar do outro lado”, Jezebel?
- Sim, Senhor. O Senhor tem razão.
- Acredite, queria não tê-la. E o condomínio acabou de passar. Ele diz sorrindo. Ela desespera, enfia o pé no freio e grita. – Aí meu Deus!
Ele cai na gargalhada - A primeira de muitas - diante da confusão mental e erros tão crassos daquela mulher que distante Dele dificilmente erra e nunca admite o erro alheio. Ela se contagia e sorri também, mas logo cai em choro compulsivo.
- Calma Jezebel, eu sei que está emocionada por estar aqui.
- Não Senhor, estou nervosa, sem saber o que fazer e menos ainda sem saber o que vai acontecer. Ela fala sem parar nem mesmo para respirar. – Sempre reclamei das submissas que vão sem planejar e eu estou fazendo o mesmo. Não avisei a ninguém do meio que vinha, cancelei compromissos importantes e estou a Sua mercê. Me comporto feito adolescente, erro qual mulher burra e sinceramente me desconheço. Ele a abraça, ela chora ainda mais.
- Jezebel... Entendo o que diz e concordo com tudo. A solta e olha dentro de seus olhos. – Por outro lado, se fosse diferente não seria. O que faz agora é pagar o preço por estar comigo. Ou paga ou não está.
Posso matá-la? Sem dúvidas que posso, mas que graça teria? Se posso vira-la do avesso, por que tiraria seu sopro de vida?
Vem comigo, relaxa, vamos rir um monte e sofrer um monte que a vida é feita disso. Uma gota de felicidade para cada três temporais de algo que entendemos e interpretamos como infelicidade. E quer saber da melhor? Adoramos tudo isso! História alegre não vira Best Seller se não tiver muito sofrimento no meio. Vem comigo e aprenda a fazer milagres. Mutar sem vergonhice em filosofia de vida.
Ela cai na gargalhada e completa: - Louca! Eu sou louca! Quero isso!!! Muito! Quero!
Ele sorri e pede para que ela dê ré até a entrada do condomínio.
Uns vinte metros para trás e eles estão na cancela. O segurança, estranhamente, não olha para o motorista e sim para o carona e a um manear de cabeça, abre a cancela sem titubear.
Jezebel estava pronta para pegar documentos, dar espaço para o segurança falar com o Senhor e se perdeu ao ver a facilidade e sincronismo de tudo. O carro sai trôpego. Ambos riem.
Já um pouco acostumada com aquele Senhor, ela segue em frente. Rindo explica muito mais pensando em voz alta que realmente explicando.
- Jezebel, nada foi dito, logo siga em frente. Um comandante nunca fala demais, se nada foi dito, siga em frente, Jezebel.
Ele sorri e alegremente a trata feito um cão. – Muito bem, Jezebel, muito bem! Viu como meia dúzia de broncas curam até o mais doente dos dementes?
Ele fecha o rosto. – Esperava uma piada onde ambos fossemos rir. Tentou puxar o humor para o seu lado.
- Sempre espere piadas em que Eu ria, Jezebel. A próxima rua a direita, a última casa, por favor.
Ela não falou nada.
O condomínio tinha apenas três ruas. A de entrada, uma a direita, outra a esquerda. Parecia um T e ao final de cada rua havia uma praça tão grande e bela quanto as casas.
O condomínio parecia vazio.
Um luxo só.
Umas vinte casas imensas no estilo Ville Du Florence Vitoriana, sem cercas em suas varandas, com vasto jardim a sua frente. Pé direito duplo, colunas largas, muito vidro e as poucas cores que surgiam eram claras, quando muito pastéis. A pintura não parecia pintura. Tudo era muito natural. Coisa de outro mundo.
Um luxo de impressionar e ofuscar qualquer tentativa de qualquer outra investida que não fosse tão imponente quanto.
Na rua solicitada as casas eram ainda maiores, mais largas. Estava claro que aquela rua era do crème de la crème daquele local.
Jezebel, sempre acostumada ao luxo, não se impressionaria, mas impressionou. Não tinha como ser diferente. Não comentou uma só palavra, mas seus olhos brilhavam diante de algo tão imponente.
A última casa daquela rua seguia o padrão das outras, mas de alguma forma parecia maior, parecia mais imponente. Combinação de cores? Adornos? Posição?
Na frente dela havia um terreno vazio, por isso era a última.
Quando ela ia subir a rampa que dava acesso a enorme porta principal a garagem se abriu. Ela não fez nada, Ele não fez nada. A garagem se abriu.
Ela olhou para Ele e diante de uma confirmação com a cabeça entrou.
O corredor era largo, suas paredes feitas com cerca viva. Tão verde, tão brilhante que inibia. O perfume daquelas flores invadiam mesmo com o carro totalmente fechado. A cada rolar de rodas ela sentia que entrava em um outro universo.
Cento e oitenta e dois metros lineares de muro, de casa. Algo pouco visto.
Ao final, um espaço ainda maior. Uma mistura de jardim, campo, espaço livre. Difícil explicar, difícil entender.
Ele desce rápido e pede para ela descer. Quando ela ia pegar a bolsa Ele diz que nada do que está ali ela precisará. Óbvio que ela pensa no telefone, mas nada diz.
- Vem.
Dito isso Ele passa para o corredor oposto da casa. Largo, muito largo para pessoas, mas pequeno para passar um carro como o dela. Outra cerca viva, outra espécie de planta, verde do piso às paredes.
Alguns muitos passos e Ele pára de frente para uma porta enorme no tamanho, altura e largura. Um vidro amarelado, côncavo, diferente.
- Quer entrar Jezebel? Ele pergunta olhando-a. Ela apenas move a cabeça em confirmação. Ele não faz nada e a porta se abre.
Mesmo de cabeça baixa ela notou que não foi Ele a abrir a porta, ao levantar a cabeça não viu quem podia ser. Entendeu que não estavam sozinhos.
O que estava por trás da porta era um corredor de teto arredondado, ricamente ilustrado e que assemelhava-se ao teto de igrejas.
Quando houve a total abertura da porta uma forte energia saiu dali. Ela não sentiu somente o vento a mexer em seus cabelos, pareciam fantasmas a lhe averiguar todo o corpo. Sua espinha gelou, seus olhos ficaram turvos, sua lente quase perde o contato. Arrepio!
As paredes eram altas, um pedaço de madeira, outro de cimento rústico. Um pedaço com quadros assustadoramente lindos, impressionistas que mostravam a dor, cenas de uso de escravos, de pessoas, de coisas e animais. O bizarro estava ali, mas mostrado de uma forma tão artística que não causava nojo, asco. Incitava o prazer. Outro pedaço com armaduras de várias épocas, estilos, partes do mundo, espadas de todos os argumentos já existentes, todas com marcas de luta, restos escuros que podiam ser sangue. Acessórios que ela nunca vira. Facas com marcas visíveis de uso, cordas que já foram claras, mas estavam escuras. Coisas, muitas coisas.
Ela tremeu. Congelou. Não sabia o que responder. Aquele lugar entrara nela e a atordoava mais que ópio. Sua coluna estava rígida, uma tremedeira nunca sentida antes. Jezebel sempre buscou cenas em que fosse subjugada e, até então, só achava aquelas em que encenava por fora e duvidava, até mesmo de si, por dentro.
Diante de sua estatuação Ele quebra o gelo. Voz calma, Ele já não era mais a mesmo, seu olhar era negro, seus cabelos voavam mesmo sem vento. Ele não pisava no chão. Estava mais alto do que já era, seu brilho era uma capa de segurança surreal e ar de algo ainda não visto.
- Olha... não precisa entrar. Aqui pode ser o lugar onde nascerá, mas o nascimento implica em morte, então é o lugar que também morrerá.
Não posso obrigá-la a entrar, o primeiro passo deve ser seu, mas uma vez que pise nesse corredor, estará autorizando-me a usá-la como quiser.
Lá dentro o certo e o errado o são segundo conceitos meus e podem ser manipulados segundo minha vontade.
O corredor é longo, a vida é curta e, se eu estivesse no seu lugar, sinceramente, não entraria.
E aí, Jezebel, vai voltar e passar o resto da vida pensando em como poderia ser se entrasse ou vai entrar e enfrentar seus monstros, seus bichos, seus primais?
Eu não entraria. Não mesmo.
Sua voz oscilava de uma forma que parecia o canto de uma sereia, o vibrar de uma gueixa, o gargalhar de uma pomba-gira, o tilintar compulsivo de um vampiro.
Ela era toda pavor. Se olhasse para Ele via seu pavor refletido em Seus olhos. Se olhasse para o corredor algo a seduzia, chamava e ao mesmo tempo implorava para ela não entrar. Ela sentia presenças ali. Pensou em morte, sua mente se permitiu viajar. Foram necessários apenas - e somente - alguns poucos segundos para ela juntar todas as peças do quebra-cabeça. A chegada, o jeito soturno, o ar de psicopata, as respostas tão precisas e rápidas, mas breves, o farto conhecimento acerca do caminho, a aparente intimidade com as meninas das lojas, o mistério natural. Sim, Ele era um psicopata rico e poderoso. Ela não sairia viva dali!
Claro, entrar seria loucura, mas não entrar poderia ser algo sem sentido, afinal Ele estava ali, ela estava ali.

De um salto lembrou que, mesmo Ele sendo conhecido no meio ninguém que o serviu estava no meio para contar a história. Será que Ele as matava?
Jezebel era um liquidificador de pensamentos, a porta era uma árvore com frutos maduros, belos e aparentemente saborosos, mas alta e com uma visível e incontestável placa em neon: Pegue, mas pague o preço.
Só que em nenhum lugar estava escrito qual era o preço.
A frente dela um Mercador astuto que não dava margens para muitas negociações, tinha um sorriso de carrasco, o mesmo que sempre usa um capuz tão grande que não conseguimos ver seu sorriso, apenas sentimos. Um algoz sem alma e disposto a tudo por 48 horas de jogo, um viciado, compulsivo.
Será que Ele saberia a hora de parar? Será que existia a intenção de parar?
Sua mente tinha dores de tanto pensar.
Mas será que Ele esperaria todo esse pensar?
Filmes passavam, perguntas surgiam sem respostas e Ele, a sua frente esperava uma posição dela.
- Jezebel? Ele a chama de volta aquele momento.
Ela não respondeu, mas olhou-O dentro dos olhos.
- Esta sol, a hora passa e eu não ficarei todo o final de tarde aqui. Não a obrigo a entrar, mas precisa decidir se entra ou sai.

Jezebel o olhou, uma lágrima escorre de seu rosto. Não foram duas. Somente uma desceu. Visivelmente percorreu seu rosto. Da maça ao queixo. Com uma força incomum a gota de lágrima caiu em seu busto, molhou seu vestido. Ela abaixou a cabeça.



(continua na próxima semana?)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Dom Demétrius e Jezebel - A insubmissa [Parte 001]

Dom Demétrius e Jezebel - A insubmissa

Antes precisamos entender como tudo começou...

Havia um mês que se falavam. A ousada submissa o abordou em uma sala de chat. Sua liturgia era impecável, suas falas – precisas! – e sua postura fascinavam até o menos litúrgico dos Dons.
Na primeira semana ela foi com tudo para cima de Dom Demétrius, enviou todos os dados possíveis, cabíveis e até os inimagináveis.
Ele não precisou pedir nada. Ela, sabedora de suas funções, fez tudo como leu – e mandou – seu figurino. Dentro dos conformes, como diriam no passado.
Para ele foi bom, pois seu trabalho resumiu-se a observar.
Na primeira semana ela foi com tudo para cima do Dom, apresentou seus poucos limites, sua disponibilidade e a lista de Dominadores que já serviu, o motivo da dispensa e quanto tempo passou sem um e outro.
Seus dados eram precisos, seu português irrepreensível, seus e-mails? De muitas páginas. Suas observações, embora coerentes, sempre cercada de preconceito e julgo. Ela era a melhor em tudo. Seu respeitado cargo público não deixava margens para argumentações, afinal quando entrou eram quatro mil candidatos para uma vaga. Ela passou em primeiro, sozinha. 89 pontos quando o segundo melhor colocado conseguira 72. Ela lembra, e fala em qualquer oportunidade, disso até hoje. Conhecia o sujeito. Um fraco de físico que concentrou todas as suas forças no intelecto. Esqueceu do emocional e era chacota por onde passava. Ela conhecia e sabia da história de todos. Afinal sua melhor persona era a de amiga do peito. Real, sincera e acolhedora confidente. Até porque se o problema fosse dinheiro ela resolvia independente do valor. Claro que, com jeitinho, falava a todos depois.
Na primeira semana ela foi com tudo para cima de Dom Demétrius.
Só não agendou jogo porque queria sentir-se mais desejada.
O caríssimo e experimentado Dominador não se mexia. E nem precisava, na primeira semana ela foi com tudo para cima do Dom! Ele não precisou fazer nada. Ainda assim, vez e outra, se assustava com alguns comportamentos e falas daquela mulher.
Louca? Desequilibrada? Demétrius preferia pensar que era uma pessoa de bem com a vida, calejada de tanto repetir padrões e por isso ia com tudo para cima de seus alvos-Dominantes.
Mas ele não cedeu. Como todo bom observador, apenas olhou, ouviu e – quando dava – sorriu.
Passado uma semana toda aquela impulsividade com total ausência de uma resposta a altura, em igual tom, passou. Senhor Dom Demétrius passou a ser chamado apenas de sr (assim, em minúscula e sem ponto. A mesma abreviação de risos na internet).
Mas ele gostava daquele perfil e acreditou que poderia se divertir bastante ao averiguar, in loco, o que aquela baiana tinha.

Era sexta-feira 13 e o telefone dela recebe uma mensagem às 10:23 da manhã: Estou no aeroporto de Salvador, por favor esteja disponível, na praça X, NºY, para me levar à Costa do Sauípe às 16 horas e ficar o final de semana lá comigo.

Se para desenhar o perfil dela precisei de uma página para o dele, preciso apenas de um espaço de linha: Sádico, Dominador, Libertino, Filho de puta com puto.
E não necessariamente nessa ordem. A que o leitor desejar, Lhe cairá bem, afinal o mundo tem poucos Demétrius e menos ainda com um perfil tão diretamente desenha. Nanquim com sangue e bico de pena.
Ela recebeu a mensagem, se assustou. Não soube o que fazer, ligou para todas as submissas num raio de dez milhões de quilômetros. Com elas, o chamou de louco, disse que não responderia, mas ao acabar de falar com a submissa de número 321, ligou para Ele.
Claro, Ele nem deu bola para o celular. Estava ligado, ela ligava compulsivamente, Ele via todas as ligações, mas não atendeu nenhuma. Ria por dentro ao ver o desespero daquele rato de laboratório em um labirinto de papelão. Explorava todos os cantos em busca de um saída. Naquele exercício não havia cheiro de queijo, circulação de ar, piso com textura diferenciada. Era tudo tão igual que o diferente não seria notado. Não ali, não com Ele.
Ela ainda chegou a ligar para alguns Dominadores afim de pedir orientação, nenhum, ao saber que se tratava de Dom Demétrius quis dar opinião. Salvo um. Dom Deméntius. Ele desequilibradamente não temia (leia-se respeitava) ninguém e não precisou ouvir toda a história para, cuspindo ao falar compulsivamente, soltar seu julgo padrão:
- Uma porra que Dominador manda mensagem de celular para submissa sem marcar jogo! É um corno! Deve ser mais um desses brochas do meio que não tem disposição para arrumar mulher e fica comendo submissa. Olha: não vai! Deixa esse viadinho esperando para ele ver que é você quem manda, minha filha. Se ao menos fosse eu, vai lá, porra! Mas esse bostinha do Demétrius é um brocha mesmo. Quer ir, vai, mas se prepara que ouvi dizer que ele nem trepar trepa! A esposa – ela interrompe perguntando se Demétrius é casado, pois ouvira dizer que não e ele segue se contradizendo – Se é casado eu não sei, sei que é corno. E manso! Sei não, mas até ouvi dizer que ele gosta de pegar em pau de submisso... Sei não...
A submissa desligou consciente de que Deméntius era muito bom para passar informação, mas nem sempre sabia do que falava.

Às 16 horas ela estava nervosa, aflita, desesperada. Não houve tempo de se arrumar, não houve tempo de se maquiar. Ela foi. Jeans, camiseta e sem mala. O intuito era conversar com Dom Demétrius e combinar uma outra data, falavam a um mês, mas nunca haviam se visto. Nem por cam. Como ela o reconheceria?
Durante todo o percurso tentou, em vão, ligar para Ele. Pensou em desistir mil vezes, pensou em não ir. Mas algo dentro de si, talvez a postura tão segura que Ele empregava, a fez ir.
Estacionou, milagrosamente, em frente ao citado número. Um dos melhores restaurantes da fina flor soteropolitana.
Ficou parada na frente do restaurante, ligou. Ligou de novo, até que um homem de tez clara, alto, bem vestido, barba capitão do mar, bate seguida e suavemente, assustando-a, no vidro da porta do carona de seu carro. Era Ele?
Ela não tinha como saber, mas suas pernas sim. Tremiam.
Ela destravou a porta e Ele entrou de um salto. Ela saltou. Seu coração disparou, o suor, algo que lhe era raro, verteu qual rio, sua maquiagem pouca virou uma sufocante máscara, ela não sabia o que dizer.
Aquele homem de olhar maduro, seguro e fixo a olhou dentro dos olhos como quem procura algo, como quem entra para procurar algo. Ela não conseguiu falar, Ele não precisou falar.
Ao sorrir seus dentes eram alinhados, amarelados pelo uso de cigarro, charuto e vinho.
- Siga, por favor, Jezebel.
Era seu nome verdadeiro. Ela nunca havia dado-o a ninguém do meio. Não gostava dele.
Se assustou e mil coisas passaram em sua mente naquele instante. Alguns pouco segundos são mais que suficientes para que horas passem qual uma tsunami em nossas mentes.
Mesmo trêmula a experiente submissa conseguiu forças para iniciar um diálogo sem sair do lugar.
- Senhor, por favor, podemos falar antes? É que eu tenh..
Antes dela acabar de falar, Ele interrompe. Sua voz era grave, mas harmoniosa, seu ritmo tinha a mescla de um canto gregoriano com ópera rock. Algo incomum e difícil de visualizar, mas encantador ao ouvir. Basta uma canção para a paixão fluir e o vicio de querer ouvir se instalar.
- Por favor, siga, Jezebel.
Ela olhou dentro de seus olhos, queria bufar, gritar e até surtar, mas sua resposta com o olhar firme e sereno a fez voltar-se para a frente, girar a chave do carro, engatar a primeira e se atrapalhar na simples manobra de sair da vaga. Quase bateu no carro a sua frente, no que estava em sua traseira no que vinha pela rua. Uma fatídica sequência de erros que demonstravam o tamanho de seu nervosismo. Ele não se abalou, nada comentou.
Sentou como um arrogante Rei senta em seu imponente trono, olhou para a frente e como se nada, além Dele, existisse.
Dez minutos em silêncio. Os pensamentos da submissa rodavam qual banana, leite e aveia em liquidificador de lanchonete. Não dava para ver nada, ouvia-se um ensurdecedor barulho e o que antes eram ingredientes isolados passavam pela mutação da alta rotação e viravam um só. Uma vitamina densa, revigorante e poderosa.
Aquela mulher de fala farta nunca teve dúvidas de que poderia falar por até dez horas ininterruptamente, já o fizera em treinamento, o que jamais havia imaginado era que conseguiria ficar calada por dez minutos. E ficou. Tensa, apreensiva, suando, tremendo, dirigindo sem nenhuma habilidade, colocando a vida de todos em risco, mas... ao fim, se sentia morta, morrendo.
Não agüentou o silêncio e, tocando um botão de seu moderno carro, ligou o rádio. Media forças? Testava limites? Quem sabe?
Dom Demétrius não falou uma só palavra e a música seguiu por mais dez minutos.
Num repente a submissa pergunta com voz embargada vinda de uma garganta seca: - O Senhor quer que eu troque de estação, Senhor?
Ele não a olha, sorri e sorrindo, mas firme, mas com a mesma voz de encantador de serpente (que são surdas) ele responde secamente: - Jezebel... não me pediu para ligar, por que tem que me pedir para controlar? O ligar, sem pedir, já foi uma forma de pegar o controle para si, afinal se eu quisesse rádio, o teria ligado, vi onde estão os botões.
Ela tremeu. Não entendeu se aquele leve sorriso de canto de boca era ironia, sarcasmo, grosseria ou Dominação. Ou tudo. Ela tremeu toda.
Não soube o que responder, se enfureceu, ficou vermelha e quando movimentou o braço para desligar o rádio pensou. Refletiu, congelou e, sem saber o que fazer, pediu desculpas com uma voz quase inaudível.
- Desculpe
- Desculpe, Jezebel, eu não entendi. Pode repetir, por favor?
Ele era de uma educação pouco vista, sua fala saía natural, firme e em cadência de quem não fazia posse, aquele era o seu natural.
- Desculpe, Senhor.
Ela abaixa a cabeça, fixa nas ruas e segue.
Ele responde sorridente e relaxado como quem quer dar colo.
- Relaxa, Jê, o clima está chato mesmo. Um calor infernal, não falamos nada e o rádio ajuda a descontrair.
Ela não comprou, mas ainda assim não se segurou:
- Quer que eu desligue o rádio, Senhor?
- Eu prefiro, afinal ouvir seus pensamentos é melhor que qualquer música.
No íntimo, ela sentiu-se invadida. Tremeu e percebeu que estava ao lado de um jogador à altura. Precisava rever as estratégias.
O rádio não foi desligado. Ele não cobrou, ela entrou em si e deixou tudo que estava fora, ficar fora.
Não agüentou ficar lá dentro mais que dois minutos. Voltou como quem volta do caminho da morte: Com uma forte puxada de ar.
- Senhor! Estamos andando em círculos, podemos conversar?
- Estamos sim, sobre o que quer falar, submissa?
O ser chamada de submissa a remete à sua condição. A esquecida quando recebeu o título de super-sub. Deixou de ser submissa para ser a mentora de um bando de ienas que riam sem saber porque.
Ela pensou, ficou um pequeno tempo olhando o trânsito, agindo como quem busca uma rua que está próxima.
- Eu, infelizmente, não tenho controle sobre a minha vida, Senhor. Não trouxe mala, não consegui organizar a minha vida para estar com o Senhor por todo o final de semana. Se o Senhor não se importar, podemos parar em algum lugar e conversar um pouco e depois eu ir para casa?
- Me importo sim, Jezebel. Você, em seu terceiro mail, falou que estava disposta, disponível e à disposição para me servir.
Quando Ele deu uma pausa para respirar, ela pegou o gancho e fez retórica.
- Sim, eu estava Senhor, mas é preciso
Antes que ela acabasse, sereno e muito firme Ele interrompe.
- Quem disse que acabei e a deixei falar? Por favor, eu falo. Quando for a sua vez, aviso. Obrigado!
Suas frases sempre findavam em “por favor”, “obrigado”, “pois não”. Dificilmente de outra forma.
Vendo-a sem ação, Ele continuou.
- Veja, Jezebel, eu não brinco de Dominar. Por uma semana, me infernizou se ofertando, quando perguntei por sua disponibilidade, disse que era senhora de sua vida, ainda sorriu ao dizer que era submissa por opção, pois a vida havia lhe dado total condições de ser uma bela e independente Dominadora.
Depois de uma semana, vendo que eu não correspondia tanto deu uma esfriada, abriu mão da mulher arrogante que se apresentava como submissa e veio como submissa e mulher.
A vi ali e aqui estou. Ou honre o que foi dito durante um mês em longos e-mails ou encosta na próxima esquina que eu descerei.
Não há um outro caminho, ou está a meu serviço e comigo vem, ou está a seu serviço e sozinha vai.
Ele estava sério, seu olhar a olhava fixamente.
A esquina chegou, o carro não parou e diante de seu olhar em aguardo de resposta, ela abre a boca para falar. A voz era de uma mulher decidida, irritada, visivelmente frustrada por haver perdido o controle da situação.
- Mas Senhor, minha vida particular é importante. Eu tenho meus compromissos, não trouxe mala.
- Mas submissa, isso aqui não é uma empresa de patrocínio em que se escolhe até onde e como ir, ou entra com tudo, ou não me interessa estar em partes. Sendo a poderosa que se diz ser, tem o poder de cancelar qualquer compromisso em nome de um final de semana comigo. A mala é dispensável por dois motivos. 1. Podemos comprar o que for necessário no caminho, 2. Só um louco pinta um diamante. Vestir uma submissa é fazer exatamente isso, logo ficará a maior parte do tempo nua.
Reflita, Jezebel. Eu sinceramente não iria, afinal realmente não trouxe mala... Tem seus compromissos... Tem uma vida particular... Eu, educadamente, me pediria para descer e seguiria meu caminho, afinal o que se perde se ficar? Se for, o que se ganha?
Ele faz jogos com a cabeça, mas seu corpo fica fixo à cadeira do carona. No fundo Ele parecia se divertir com aquilo tudo. No fundo Ele sabia que o jogo, que antes era dela, aos poucos, se tornava Dele. Ambos sabiam que alguém poderia perder, que ambos poderiam ganhar e que aquele não era um jogo de jogatina onde um perde e outro ganha, era um jogo intelectual onde não havia perdedores e, independente da cartada, ambos sairiam mais ricos do que quando entraram.
Jezebel só respirava fundo, só pensava. Mesmo com o ar condicionado do carro a 15° sua mente fervia, seu corpo era uma fornalha de 1300°, a mesma temperatura necessária para fazer a espada de um samurai dobrando um bloco de ferro mil vezes.
Pensou, pensou e como Ele não disse nada ela respira fundo e fala como quem pensa sozinha.
- Vamos lá! Eu encaro! Tem que ser assim?! Eu encaro! Eu vou! Seja o que Deus quiser! Não tem como ser tão ruim assim! Eu quero, eu vou! Pronto! Tá decidido! Eu vou! Eu Vou!
Ela dispara e não percebe que se descontrola ao dizer a si mesma o que tem que ser feito. Só não percebe que aquele sereno Senhor, ao seu lado, é quem controla tudo, até seus atos mais impensados.
Ele a olha, ela se toca que está em aparente descontrole. Envergonha-se, respira e sorri com timidez. Ele estava dentro. A partir dali podia configurar, desconfigurar, reconfigurar e fazer o que mais quisesse. Pensariam outros.
Ao retomar o controle de si, ela pergunta como quem nunca surtou. Serena, controlada, segura.
- Para onde vamos, Senhor?
Ele ignora o surto, não diz absolutamente nada sobre ele e responde olhando para a frente.
- Por favor, Jezebel, para a Costa do Sauipe.
- O Senhor se importa se eu for fazendo algumas ligações para cancelar alguns compromissos
- E se eu me importar?
Ela fica constrangida, mas responde sem titubear
- Olha, Senhor, eu preciso avisar o povo que contava comigo para fazer algumas coisas.
- Se precisa ligar, é indiferente eu me importar ou não, submissa.
- Me desculpe, mas para mim não é bem assim. Se o Senhor se importar eu ligo mais tarde, ligo do hotel, sei lá.
Ela não completa sua frase e Ele interrompe com uma pergunta que a desconserta.
- Quem disse que vamos a um hotel?
Ela gelou ao perceber que havia perdido o controle mais uma vez. Aquela mão foi Dele. A mesa estava a favor Dele e sua boca era maior que seu cartão de crédito. Algo realmente descontrolado.
Não houve resposta externa, internamente ela fervia. Sentia raiva mesmo. A serenidade daquele homem beirava a indiferença e isso causava um estranho distanciamento. Ela se via no dia-a-dia com a mesma postura e ao mesmo tempo que aquilo a fascinava, pois em seu entendimento aquilo é segurança e poder, a afastava uma vez que frieza era sinônimo de rejeição.
Tudo que ela alcançou na vida foi justamente para evitar a rejeição. Ela precisava se sentir acolhida, necessária, fundamental, base e se dizia básica. Não era. Já vimos que não era.
Entre indignação e adoração ela seguiu muda. Com raiva, mas muda.
Ele não perguntou duas vezes.
O rádio perdeu sintonia, o carro seguiu pela estrada, eles estavam ali.
Ela desligou o rádio, Ele o ligou de novo.
- Vamos ver que tipo de CD fica pronto em sua cedezeira.
Mexeu para lá, mexeu para cá. Parecia bem familiarizado com os controles do rádio.
Entrou um CD de Axémusic, Ele a olhou dentro dos olhos, ela não entendeu se o olhar foi de aprovação ou reprovação.
Mudou-se o CD antes dos acordes iniciais e os gritos de “Saí do chão”.
O segundo CD era do Chico Buarque. Ao que parece Ele conhecia o CD e disse indo direto a música de número 13.
- Esse é o seu hino nesse final de semana.
A música era Geni e o Zeppelin



- Sim, Senhor.
Sua voz era de quem não estava gostando da brincadeira, havia um “q” de falta de estímulo e um ar de tédio.
Perde-se o prazer pelo jogo? Quando só se perde, sim.
A música entrou como uma faca, mas o efeito foi revigorante. Ao mesmo tempo que a música tocava Ele puxava seu vestido e fazia um bailar de dedos em suas bem tratadas, torneadas, sedosas coxas. Ela teve um misto de tesão e alegria. Seus dedos, apesar de grandes, bailavam qual criança na chuva. A letra não importou, o bailado agradou.
Até o segundo refrão.

Essa dama era Geni
Mas não pode ser Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni
Maldita Geni pra qualquer um, maldita Geni.

Nessa hora Ele pausou o rádio e sorridente soltou a pergunta:

- Quantas vezes, em sua vida, Jezebel, já foi Geni? Quantas vezes foi escolhida mesmo sendo a pior entre as piores?
Ela silencia. Não queria responder, queria pensar. Ele segue fomentando a fornalha de suas lembranças.
- Quantas vezes foi taxada de puta quando ainda era virgem? Quantas pedradas levou por estar em seu canto, Jezebel?
Sua cabeça se abaixa, seu coração dispara e a alegria de antes dá lugar a um pesar. O tempo, mesmo ensolarado, fica cinza dentro de si. Não há sol que faça aqueles dias serem de luz.
Ele repete as mesmas perguntas. Ela olha para a estrada, ele olha no canto de seu olho direito, ela esfria. Não segura e chora.
Se assumiu Geni. Aceitou as pedras, assumiu ter prazer no guerreiro tão vistoso, tão temido e poderoso que era dela prisioneiro. Será que ela, com todos os seus segredos tão seus, teria seus caprichos?
Tão cheirando a brilho e a cobre
Preferia amar com os bichos
Ele a olhava, pedindo para estacionar o carro, incentivava seu choro. – Bota para fora que não se chora para dentro!
E ela estacionou, e seu mundo desabou qual rio em chuva de verão, são as águas de março...
Quando o choro diminuiu Ele a olhou dentro dos olhos, sem mover muitos músculos aumentou o rádio e a beijou.


Um beijo apaixonado, intenso, vivo. Suas bocas molharam, seus corpos suaram. Sinos? E porque não? Aquela mulher fresqueou ao sentir a boca de um homem buscando a sua. Palmas grandes, dedos longos e força! Seus cabelos recebiam um misto de massagem e puxões, seu cérebro interpretava aquilo como carinho e liberada adrenalina para o corpo. O mundo girava. A outra mão do homem reconhecia o corpo que seria seu, alisava, apertava. Do interno das coxas a nuca, passava pelos seios. Acredito que o sutien de bojo o desestimulou, pouco foi ali outras vezes naquelas gotas de eternidade. Ela visivelmente tremia diante daquele approach. O choro deu lugar a lágrimas de riso, ao ar de prazer que se fazia bailar em si.
Ambos se queriam, ambos se permitiam e ela achou o sentido de estar ali. Era Ele!
Tempos passados, tempos passando, o beijo finda com os olhares fixos em si. Se olhavam quando Ele quebrou a poesia do momento.
- Sendo eu um homem tão nobre, tão cheirando a brilho e a cobre, você vai preferir amar com os bichos, minha Geni?
Ela abaixou a cabeça. Estava totalmente tomada, absorta. Não entendia o que ele falava, não se entendia.
Ele olhou para o rádio, olhou para ela. Abaixou a música e ela entendeu.

A viagem seguiu para a Costa do Sauipe com ele alisando suas coxas e fazendo-a perder a direção por algumas vezes.
Vez e outra, ao ultrapassar um caminhoneiro, ele colocava seus seios à mostra e apertava a buzina para chamar a atenção. Seu carro era alto e não havia como o caminhoneiro ver, mas a buzina em resposta a deixava sem chão. Uma das coisas que havia dito é que não era exibicionista. Gostou do jogo, o acolheu, acatou sem pensar em aceitação.
Certa hora houve uma troca e o que antes eram os seios, passou a serem as coxas. Isso os caminhoneiros viam. Um ou outro aumentava a velocidade, colocando a vida de todos em risco, e os seguia por alguns metros mais.
Ela havia se libertado?
A conversa já era mais solta da parte dela, Ele perguntava amenidades sobre o meio, a vida comum, sobre as pessoas. Ela respondia cuidando do que falava, focando mais no que ouvia.
Vez e outra uma reprimenda. Ela estava com Ele tão dentro que aquilo já não incomodava tanto. Pesava, pois em se autodenominando experiente, uma reprimenda, ainda que por apresentação de conceitos equivocados era de um peso enorme. Sobretudo se acrescido do peso daquele Senhor.





(continua na próxima semana?)